segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O espírito de partilha

O surf moderno é uma actividade solitária. Mesmo numa praia como Carcavelos ao fim-de-semana cada um dos milhares de surfistas na água estão a sós, eles e as ondas. Uma das regras mais importantes do surf, actualmente, é ela mesma representativa desta solidão. Uma onda um surfista. Nada é pior para um surfista que um dropinanço, nem mesmo levar com um set todo na cabeça. A lei da prioridade retém essa essência individualista do acto de apanhar ondas. Assim, a sós com as ondas, os surfistas criam um enorme muro entre eles e o resto da sociedade. Não sendo o surf actual, infelizmente, um desporto colectivo é extraordinariamente difícil explicar ao resto das pessoas o valor global de uma onda, uma onda que seja. Quem nunca apanhou uma onda não vê mais do que uma banalidade nesse fenómeno, as ondas não são únicas, são banais, estão sempre lá, vindas do mar, umas maiores, outras mais pequenas, ininterruptas, sem mais utilidade nenhuma que não seja dar vazão aos sonhos dos surfistas, essa imensa minoria de surfistas que habitam as costas do mundo. Para o resto das pessoas, para a maioria, as ondas não servem para nada. Nos dias de hoje, quando as ameaças que pairam sobre o futuro da Terra são de tal maneira graves, cabe a todos os surfistas, a cada um de nós que sabe dentro de si a emoção de uma onda, cabe-nos a obrigação de partilhar com os outros, os que não sentem as ondas, essa emoção. A tarefa de defender as ondas começa na defesa do meio ambiente, na luta pela sustentabilidade, na preservação e na partilha dos recursos. O nível da água do mar está a subir. Provavelmente num futuro não tão longínquo como desejaríamos os passeios marítimos e as avenidas litorais do Dr. Alberto João Jardim serão submarinos mas, nessa altura, Teahupoo, Pipeline, os Coxos e outras ondas terão, também, desaparecido.Se não começarmos já a partilhar o prazer das ondas com quem nunca surfou será impossível passar a mensagem de quanto é importante preservar uma onda. Uma ideia que todos os surfistas de hoje deviam ter bem presente é que se os antigos havaianos não tivessem partilhado as suas ondas, ou se Duke Kahanamoku não tivesse ensinado tanta gente pelo mundo fora a surfar nenhum de nós saberia o que é surfar. Também eu procuro a maneira ideal de fazer passar essa mensagem de amor pelo mar e pelas ondas e de partilha, talvez este blog seja uma forma de o fazer, julgo, no entanto, que o mais importante é a atitude, como no nome desse fórum que me fizeram descobrir, a atitude dos surfistas dentro e fora de água, de uns com os outros e para os outros. Uma atitude que obrigue quem nunca surfou a respeitar as ondas e, a seguir, a respeitar os surfistas. Se todos começarmos por partilhar, partilhar uma onda, por exemplo, com um amigo ou com um desconhecido e se outros fizerem o mesmo por nós, será, de certeza, mais fácil preservar o que nos rodeia. O mundo não é nosso para gastar, nós apenas o guardamos para os que vierem a seguir.
Nem todos os não surfistas são insensíveis às ondas. Adivinho que estás a dizer com os teus botões "esta ainda não percebeu que nadar no mar encrespado ou mergulhar nas ondas fica a
anos-luz do prazer do surf".
Claro que por muito que imaginemos as sensações de um surfista, há sempre muito que nos escapa. Mas posts como o teu fazem-nos ficar mais perto.



Obrigado pela partilha. Aloha.

POR: CONDE

1 comentário:

  1. Acho que tens toda a razão.
    Se há mar no mundo, então a casa do surf, é o mundo. Proteger é partilha.

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