Apontei o despertador para as 7 da manhã. Quando tocou, à hora marcada, fiz o costume: confirmei as horas, desliguei-o e dei meia volta na cama para voltar a dormir.
Depois, como sempre, houve ali um ou dois segundos daquilo a que posso chamar "tempo de decisões", em que a minha consciência desperta ou não e que consiste numa pequena reflexão metafísica sobre a beleza da vida de quem acorda cedo – e que geralmente descamba na beleza do sono matinal. Desta vez, porém, despertei.
Ainda era de noite, muito cedo e fazia frio como se não houvesse amanhã – ou como se este fosse numa era glaciar - mas os melhores surfistas do mundo a competirem a 40 minutos de distância foram razão suficiente para me fazer levantar da cama. Aqueles tipos são aliens e vê-los surfar ao vivo, com ou sem lycra, a dois palmos do nosso nariz, é um privilégio que não dá para desperdiçar.
E depois, é simples: os factores Saca e Slater são demasiado fortes.
Saio de casa e inauguro o Outono ou Inverno ou lá o que é isto que de manhã é uma coisa e à tarde outra e mais outra ainda: para já são 9 os graus de temperatura que marca o meu gelado carro.
O mar ouve-se ao longe na forma daquele barulho incessante das marés muito vazias na Ericeira, com estalos nas pedras que tornam meio-metro glass num recital digno de três metros tempestade. Faço-me à estrada enquanto um nevoeiro cerrado se estende pelos vales da zona Oeste, fechando o horizonte no sentido Este. Nem se vêem aquelas enormes ventoinhas eólicas, todas alinhadas por quilómetros e quilómetros numa linha de montanha paralela ao mar.
No mar, tudo calmo. Os tons melancólicos fazem adivinhar uma tempestade para breve. Igual a tantas outras, por entre todas aquelas povoações pelas quais vou passando e onde a vida passa igual, como nos outros dias deste bom e velho oeste. Um velho amparado por uma muleta carrega sacos de milho e atravessa-se no meio da estrada; um tractor arrasta-se a 10 à hora; mulheres carregam carros de compras; os homens aglomeram-se à porta dos cafés; chaminés de padarias lançam fumo para o ar. Há toda uma azafama matinal que em conjunto constrói um cenário digno da aldeia saloia do Zé Franco, e que se reproduz repetidamente e por vários quilómetros. E cá está, finalmente, Peniche.
Por esta altura sabia que não ia haver campeonato na costa norte de Peniche. Como já tinha visto o mar, parecia-me improvável que a prova acontecesse nos Super mas ainda assim estacionei ali por perto, não no parque de estacionamento edificado para o efeito - por vergonha, não quis ser a primeira.
E cá estamos. Supertubos. Com tudo no sítio. “Bela estrutura”, pensei várias vezes enquanto olhava à volta – e sim, a do campeonato também. Estava ali no olho do furacão com todo aquele frenesim típico dos primeiros dias de campeonatos importantes: surfistas a chegar a conta gotas, media a fazer acreditações no centro de imprensa, miúdas a fazer pose indisponível, tipos na segurança do chão a mandar palpites sobre o que os outros deveriam fazer no topo de estruturas e o staff do The Search a fazer os últimos preparativos para uma festa que não chega a começar. Porque faltam as ondas. E como vai ser?
“Vai estar gigante, o mar vai estar gigante, bródê”. Fazendo jus ao epíteto de rapaz mais expressivo do circuito, Jihad Kodr solta um caloroso cumprimento, lançando depois um olhar assombroso a acompanhar esta frase. Não sei como vai estar, não faço ideia, acho que sim mas penso que não. Uma coisa é certa: como um mantra dos sete mares, aquela frase tem-me ecoado repetidamente na cabeça.
PERFEITO!
ResponderEliminarLIIINDO!
ResponderEliminarLIIINDO! 5*
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